A Comissão Especial do Plano Diretor realizou uma Audiência Pública, na manhã desta quinta-feira (21/11), no plenário do Palácio Pedro Ernesto, para debater o Projeto de Lei nº 3237/2024, de autoria do Poder Executivo, que regulamenta o IPTU progressivo. O dispositivo é previsto no Plano Diretor, aprovado pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro para os próximos 10 anos, e também no Estatuto da Cidade, mas sua aplicação ainda precisa passar pela aprovação da Casa.
A reunião foi conduzida pelo presidente da comissão, Rafael Aloisio Freitas (PSD), e contou com as presenças dos demais membros do colegiado: os vereadores Tânia Bastos (Republicanos), que é relatora, Alexandre Isquierdo (União Brasil), Átila Nunes (PSD), Dr. Gilberto (Solidariedade), Rogério Amorim (PL), Jorge Felippe (PP), Tainá de Paula (PT), Pedro Duarte (Novo), Rosa Fernandes (PSD), Thaís Ferreira (PSOL) e Vitor Hugo (MDB).
O presidente da Casa, Carlo Caiado (PSD), e os parlamentares Jorge Pereira (PSD) e Márcio Ribeiro (PSD) também participaram do debate. Representaram a prefeitura: o secretário municipal de Desenvolvimento Urbano e Econômico, Thiago Dias, e o chefe de gabinete do prefeito Eduardo Paes, Fernando dos Santos Dionísio. Acompanharam a reunião ainda os procuradores do município Gabriel Coutinho Vieira e Marcelo Leite Lima.
“Em linhas gerais, estamos apresentando aqui como será o funcionamento do mecanismo”, introduziu o secretário Thiago Dias. “(O IPTU progressivo) não é algo novo, estamos falando de uma existência de pelo menos 24 anos. Há um ano, essa Casa aprovou esses termos no Plano Diretor, mas por se tratar de uma matéria tributária que tem efeito extrafiscal, ou seja, que não persegue um efeito arrecadatório, mas de desenvolvimento, optou-se por tratar dela de forma apartada, para que a gente possa garantir maior segurança jurídica em sua aplicação”, acrescentou.
O secretário explicou ainda que, caso aprovada, a regra não será aplicada indiscriminadamente a todos os imóveis, mas sim a partir de um mapeamento que está sendo desenvolvido.
“O IPTU progressivo trata-se de uma autorização e de um instrumento de desenvolvimento da cidade, consoante às suas diretrizes urbanas. Ele não será aplicado indefinidamente e aleatoriamente em toda a cidade, mas sim nos seus eixos de crescimento, onde o Plano Diretor entende que convém se desenvolver, do ponto de vista urbanístico e de sua função social”, disse Dias. “O mapeamento é possível a partir do cruzamento de dois sistemas que a prefeitura tem. Esse cruzamento já está sendo estudado e já pedi à equipe de planejamento para que produza essa simulação. Vamos colocar isso em ambiente online para consulta pública”.
O presidente da comissão, Rafael Aloisio Freitas, destacou a importância da discussão sobre o tema, mas lembrou também que ele já foi amplamente discutido durante o período de elaboração do Plano Diretor, que durou dois anos. Argumentou ainda que o PL não trata sobre a criação de um novo imposto.
“As audiências públicas são extremamente importantes para conseguirmos captar observações que talvez ainda não tenhamos captado”, disse Aloisio Freitas. “Claro que todos os instrumentos vão possibilitar arrecadação da prefeitura, sim, mas eles têm em sua essência o objetivo de melhorar o desenvolvimento urbano sustentável. O texto do Plano Diretor foi adaptado para se transformar nesse PL, e 80 % do texto dele é igual. O que temos que olhar são as diferenças, que são as regulamentações necessárias, para que possamos colocar para frente um instrumento que já há muitos anos é discutido. Chegou o momento de tomarmos a decisão”.
Representante do departamento do Instituto dos Arquitetos do Brasil no Rio de Janeiro, Alder Catunda, leu uma nota técnica da organização em plenário e declarou que o órgão é favorável à aprovação do projeto de lei.
“A regulamentação do parcelamento de edificação e utilização compulsórios, com a consequente aplicação do IPTU progressivo para imóveis que não cumprem a função social, é um marco que consideramos fundamental para a política urbana do Rio de Janeiro”, disse Catunda. “Cabe ressaltar que a discussão é meramente formal, no intuito de evitar insegurança jurídica na aplicação do instrumento. A discussão do mérito, hoje, nos parece que já havia sido superada, no próprio processo do Plano Diretor, razão pela qual entendemos que o PL está em condições de ser votado e aprovado”.
Haroldo de Araújo, diretor jurídico da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário (Abani), por sua vez, questionou os prazos propostos pela prefeitura no projeto de lei. “A colocação desses prazos que estão sendo impostos, principalmente para a adoção de medidas por parte dos proprietários, são muito curtos, não me parecem proporcionais e razoáveis. Naturalmente vão acabar desencadeando na tributação”, argumentou.
O secretário municipal, então, explicou: “Se houve algum tipo de demora ou imprevisto, por óbvio, isso não será imputado para efeitos de sanção. O IPTU progressivo só pode ser aplicado no âmbito do devido processo legal, exercido contraditório e ampla defesa. Se verificado que o prazo não foi cumprido por inação da administração pública, ele torna-se incabível.
O vereador Pedro Duarte, membro da comissão especial, criticou as multas previstas no projeto de lei em caso de descumprimentos. Segundo ele, em cinco anos, os valores poderiam chegar a 60% a 70% do valor do imóvel. O parlamentar também questionou a prefeitura sobre como seria feita a fiscalização para determinar quais imóveis, condomínios ou terrenos poderiam ser cobrados.
“Essa multa não deveria existir. A própria pena deveria ser o IPTU progressivo. Deveria haver um debate próprio sobre elas e elas deveriam ser retiradas. Nós deveríamos primeiro ter um sistema funcionando e a prefeitura vir aqui, mostrar o que foi mapeado. Minha sugestão é que a gente só discuta esse projeto depois que o estudo for disponibilizado, comprovando que aqueles imóveis estão vazios, abandonados. Como será provado que um imóvel tem 60% da sua área total desocupada? Isso precisa ser respondido de forma muito clara e objetiva”, argumentou o parlamentar.
Rogério Amorim também criticou multas previstas no projeto. Acrescentou ainda que a aplicação do IPTU progressivo, como já é implementado em São Paulo desde 2002, não pode ser replicada no Rio.
“Você além de aumentar o imposto, com a punição do IPTU progressivo, ainda incide multa?”, questionou Amorim. “Não adianta pegar o modelo de São Paulo e copiar, porque aqui nós vivemos características urbanas sociais e de violência que são diferentes. A própria prefeitura tem inúmeros imóveis que estão abandonados ou com uso precário”.
O presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro (CAU-RJ), Sydney Menezes, disse que o tema é polêmico, precisa ser debatido até não restarem dúvidas, mas lembrou também que o assunto é debatido desde a Constituição de 1988.
“Espero que possamos pegar os pontos que nos unem, onde há convergência, e que trabalhemos esses pontos. Afinal de contas, o que está em jogo? Qual é o interesse do projeto? Isso tudo precisa ficar muito claro. É claro que há o viés arrecadatório, mas precisamos, com muita cautela, estabelecer essas regras e limites. Até onde é importante utilizar o IPTU progressivo para melhorar a ambiência urbana e até onde, e aí que vem o perigo, utilizá-lo com objetivo arrecadatório?”.
O vereador Márcio Ribeiro, por sua vez, se posicionou favorável à aprovação do projeto.
“Nós acompanhamos muitos problemas que a cidade tem, por causa de seus imóveis abandonados. Eu fui subprefeito da Grande Tijuca e, tanto lá, como em outros lugares, já tivemos discussões sobre alguns imóveis abandonados, em que a gente vê a importância da ocupação desses espaços, até por uma questão de segurança pública. É lógico que nós não podemos transferir essa responsabilidade totalmente para os proprietários dos imóveis, mas precisamos discutir um projeto que resolva esses problemas e outros que temos por conta dessa quantidade de imóveis abandonados que encontramos pela cidade”, disse.
Como funciona o IPTU progressivo
De acordo com a prefeitura, a proposta busca enfrentar um dos principais desafios para o planejamento e gestão do solo na cidade: a grande quantidade de imóveis desocupados ou subutilizados, mesmo em áreas bem servidas de infraestrutura.
A matéria prevê que os proprietários dos imóveis desocupados ou subutilizados serão notificados pela prefeitura a fim de promover o seu aproveitamento adequado. Eles terão o prazo máximo de um ano a partir do recebimento da notificação para regularizar a utilização ao imóvel e protocolar um dos seguintes pedidos: licença de parcelamento do solo, licença de construção de edificação ou licença para reforma ou restauração de edificação.
Em caso de descumprimento das condições e dos prazos estabelecidos, incidirá sobre os imóveis notificados o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) Progressivo no Tempo: a cada ano, até o prazo de cinco anos, a alíquota será aumentada até o limite máximo de 15%. Passado o prazo sem que o proprietário tenha cumprido a obrigação de parcelamento, edificação ou utilização do imóvel, o município poderá desapropriar o local em questão, com pagamento em títulos da dívida pública.