Como enfrentar os enormes índices de evasão escolar que são esperados para o pós-pandemia? Que tipo de educação o jovem de hoje deseja ter? Estas foram algumas das perguntas que nortearam a audiência pública virtual que aconteceu na manhã desta quarta, dia 25, com o tema "Juventudes e educação no Rio de Janeiro: os desafios e as perspectivas". O encontro foi organizado pela Comissão Especial da Câmara Municipal do Rio voltada para o tema da Juventude e contou com a presença de especialistas no tema, educadores, estudantes e acadêmicos.
O presidente do colegiado, o vereador Marcio Santos (PTB), abriu a audiência pública reforçando qual é o papel da comissão e como debates assim são primordiais para a criação de políticas públicas eficientes. “A ideia dessa comissão é levantar os problemas e ver qual é a forma que nós podemos tirar a juventude do atoleiro. Um dos maiores problemas hoje é o desemprego”, destacou o parlamentar.
Um dos participantes da reunião virtual foi o reitor do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ), Rafael Almada. Ele destacou a importância de se pensar as universidades e institutos federais dentro do contexto da política pública da cidade, como uma forma de qualificar os jovens e combater o desemprego. Almada acredita que integração é a palavra-chave. “Por mais que a União, os institutos federais e as universidades tenham essa formação de nível superior e formação técnica dentro da educação profissional, essas instituições precisam sim dialogar com as escolas municipais e com as escolas estaduais da cidade. Hoje a gente tem um número expressivo de estudantes dessas instituições que de certa forma estão no dia a dia da nossa juventude, com as mesmas dificuldades”, relatou. O IFRJ possui 15 unidades no estado, duas delas estão situadas na cidade do Rio, uma em Realengo e a outra em São Cristóvão.
Geração nem-nem ou geração ioiô?
Muitos jovens hoje em dia não trabalham e nem estudam, o que rendeu a criação do conceito “nem-nem”. Mas para o professor do Programa Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Doutor Diógenes Pinheiro, o conceito é incorreto. “Quando a gente analisa a experiência dos jovens hoje em relação à escola, o que a gente percebe é uma entrada e saída da escola, uma entrada e saída do mundo do trabalho. Então, a gente está fazendo um retrato muito imediato de uma situação. Se você for conversar com esse jovem dois meses depois, ele já arrumou um trabalho, mesmo que precário. Ele já voltou para a escola, mesmo que às vezes ele tenha que sair de novo. Essa geração atual a gente tem chamado, como diz o sociólogo português José Machado Paes, de geração ioiô”, contou o pesquisador que trabalha há 20 anos com avaliação de políticas públicas de juventude.
Pedagoga e coordenadora pedagógica do NICA – Núcleo Independente e Comunitário de Aprendizagem da Favela do Jacarezinho, Etel Oliveira, acompanha de perto os percalços dos jovens do seu território. E, na sua opinião, políticas públicas efetivas são desenvolvidas com escuta. “Penso que nós precisamos ouvir mais esses jovens. Eles estão falando, estão se colocando. Então não adianta você fazer uma política pública que venha de cima, sem ouvir essa galera que é através da sua arte, da sua música, através dos seus corpos, seu cabelo, sua cor, sua roupa”, acredita.
Para a chefe de gabinete da secretaria especial da Juventude Carioca - JUV-RIO, Gabriela Sampaio, o conselho de juventude vem preencher essa lacuna. “Nós acreditamos que a existência de um conselho de juventude seja algo que vai oportunizar que essas políticas públicas sejam pensadas em conjunto com os nossos atores sociais diversos, plurais, distintos e que se complementam. Uma política pública voltada para a juventude tem sempre que entender a heterogeneidade do nosso público. Temos estratos mais vulneráveis, temos locais mais vulneráveis, pessoas vivendo situações de injustiça ambiental extrema, não acesso à uma educação que possa oportunizar emancipação do conhecimento, do conhecimento crítico que nos permite ter um engajamento social.”
Pesquisa investiga quais são os sonhos dos jovens
Capitaneada pela Fundação Roberto Marinho, a pesquisa Juventudes, Educação e Projeto de Vida foi realizada em 2020 com jovens de todo o Brasil. O objetivo era explorar as percepções e expectativas dos jovens das classes C, D e E da escola pública sobre projeto de vida; escola e aprendizagem; evasão; internet e aprendizagem; e desafios e redes de apoio. De acordo com André de Holanda Padilha Vieira, representante da Fundação, 60% querem terminar os estudos e se formar; outros 47% desejam realização profissional e trabalhar na própria área. Para ele, isso significa que nem tudo está perdido e que é possível reverter a curva ascendente da evasão escolar, algo que é resultado de um longo processo.
“Aqui a gente tem um dado fundamental que é a importância da busca ativa, ainda mais tendo em vista esse risco maior de evasão escolar e também da grave situação causada pela pandemia. Vimos na pesquisa que metade dos jovens das classes C, D e E que já tinham abandonado a escola, jovens desse perfil que muitas vezes abandona e volta. Metade não tinham sido procurados por ninguém, nem pela instituição escolar, nem por colegas e amigos, pai e mãe, e nem pela assistência social, o que é importante quando a gente pensa em políticas sistêmicas”, ressaltou Vieira.
Os tempos de escola estão guardados com muito carinho na memória do líder comunitário e morador do complexo do Chapadão, Jorge Luiz Franco. Para ele, é necessário e urgente criar estratégias educacionais que “prendam” a atenção do jovem. “A escola não é só para ensinar a ler e a escrever, é para formar cidadãos também. A escola é para ensinar a ter dignidade, ensinar cidadania. Estou chegando aos meus 60 anos e a melhor fase da minha vida foi na escola. Os melhores amigos que eu tenho na vida vieram da escola, a esposa que eu casei conheci na escola”, contou emocionado.
Relatora da Comissão, a vereadora Thais Ferreira (PSOL), disse que todas as propostas e sugestões feitas durante as audiências públicas realizadas pelo colegiado vão constar em um documento. “A nossa intenção no final é apresentar um relatório sobre todas as escutas que foram feitas e principalmente trazer soluções propostas pelas falas tão importantes que já passaram por aqui.”
Ainda participaram da reunião virtual o secretário geral da União Estadual dos Estudantes (UEE), Victor Davidovich e a diretora da Associação dos Estudantes Secundaristas do Estado do Rio de Janeiro (AERJ), Nicole Viana.