A Comissão de Meio Ambiente da Câmara do Rio realizou, nesta quinta-feira (9), audiência pública para tratar da regularização fundiária de áreas não tituladas da Fazenda Nacional de Santa Cruz, que ocupa 10% da superfície da cidade do Rio de Janeiro. Os moradores da área cobraram agilidade na solução do problema, que se arrasta há décadas e impede que os residentes possam ter a titularidade e posse das propriedades. Representantes do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), responsável pelo patrimônio, ratificaram a intenção do órgão em doar as terras para a Prefeitura do Rio de Janeiro.
De acordo com o chefe da Divisão de Governança Fundiária do Incra, Pablo Pontes, a questão sobre a posse das terras da Fazenda de Santa Cruz precisa ser resolvida o mais rápido possível. “Em uma boa parte da área, os moradores já têm situação regularizada, mas muitos ainda não. Se quiserem, por exemplo, pegar um empréstimo com um banco ou dar a casa como garantia, eles não têm este direito, mas moram lá há anos”, enfatizou. Para a solução do problema, Pablo Pontes afirma que é preciso definir as áreas para a doação e transferi-las para as prefeituras, a partir de acordos firmados com estas. “O Incra tem entrada no universo rural, mas não tem uma boa entrada no universo urbano. Já as prefeituras o têm e, com isso, poderão ofertar serviços aos moradores”, explicou o servidor, fazendo referência a saneamento, transporte, saúde, entre outros pontos.
“Considerando a extensão da área e o número de pessoas envolvidas, a Fazenda de Santa Cruz é a área mais relevante em termos de regularização na cidade do Rio”, observou Alexis Mendonça, do 4º Ofício de Registro Geral de Imóveis do Rio de Janeiro. Para ele, a doação à Prefeitura deve ser imediata. “O lado da Fazenda de Santa Cruz que pertence ao município do Rio já está completamente em nome do Incra, o que é um facilitador”, observou.
O Incra e a UFRRJ firmaram parceria, por meio de termo de execução para, entre outras ações, executar o georreferenciamento de cada uma das grandes áreas que compõem a Fazenda de Santa Cruz, identificar as áreas que já possuem Registro Geral de Imóveis (RGI) e titularizar as áreas de posse. Com a ação, espera-se beneficiar pelo menos 300 mil pessoas.
Mendonça ainda informou que a Prefeitura do Rio deverá aceitar a doação através de um termo lavrado pelo próprio Incra, que será registrado em cartório. A partir daí, o Executivo municipal poderá desmembrar as áreas ou fazer uma regularização fundiária urbana. “A Prefeitura do Rio poderá regularizar as áreas que já estejam demarcadas, em paralelo ao trabalho de mapeamento pela UFRRJ das demais áreas”, sugeriu o oficial do cartório.
Morador de Santa Cruz, Edson Correia da Silva falou das dificuldades de quem reside no local, mas não tem o título do imóvel ou da terra. “Para nós, a doação do Incra para a Prefeitura será muito bem-vinda. Sugiro que estes órgãos procurem as associações de moradores e as colônias de pescadores para que estas possam apontar quem, de fato, ocupa a terra e o imóvel, e não tem o instrumento de posse”, disse. O representante da Secretaria Municipal de Planejamento, no entanto, reforçou que o trabalho requer cuidado. “Há todo interesse em se fazer, mas o esforço deve ser conjunto, e devemos considerar a participação de diversos órgãos, como a Secretaria Municipal de Habitação, de Meio Ambiente e a Superintendência de Patrimônio Imobiliário, no sentido de se traçar um plano que renda frutos e não fique apenas no papel”, disse André Peixoto.
Zico (Rep) lembrou que toda a Zona Oeste da cidade sofre com o problema de titularidade de terras e imóveis. “A doação do Incra será o facilitador para dar dignidade e oportunidade aos moradores da região”, salientou. Para facilitar ainda mais o processo, Zico adiantou que apresentará um projeto de lei que torna a Fazenda de Santa Cruz área de interesse social. Já o vogal da Comissão de Meio Ambiente, vereador Chico Alencar(PSOL), considerou positiva a movimentação dos órgãos envolvidos. “O Incra quer doar a terra, a Prefeitura quer resolver a situação e a universidade está empenhada no trabalho de mapeamento para a regularização das áreas”, pontuou.
Também estiveram presentes na audiência os vereadores Vitor Hugo (MDB), Chagas Bola (União) e Rafael Aloisio Freitas (Cidadania), a historiadora do projeto de Regulação Fundiária da Fazenda Santa Cruz da UFRRJ, Edite Moraes da Costa, e o superintendente regional do Incra, Leandro Guimarães.
Histórico
A Fazenda Imperial de Santa Cruz foi uma sesmaria fundada por Cristóvão Monteiro em 1567 nos arredores da cidade do Rio de Janeiro. Com a morte de Cristóvão Monteiro, sua esposa, dona Marquesa Ferreira, doou aos padres da Companhia de Jesus sua parte das terras.
Diante da expulsão dos Jesuítas dos domínios de Portugal e suas colônias em 1759 por ação do Marquês de Pombal, o patrimônio da Companhia de Jesus (e a Fazenda Santa Cruz) foi revertido para a Coroa Portuguesa e, posteriormente, para a Família Real.
No fim do Império grande parte da fazenda já estava ocupada por posseiros com a existência de vários núcleos urbanos. Com a proclamação da República, as terras foram incorporadas ao patrimônio da União e o imóvel passou a se chamar Fazenda Nacional Santa Cruz. Atualmente, a fazenda cobre partes dos municípios do Rio de Janeiro, Itaguaí, Seropédica, Paracambi, Japeri, Engenheiro Paulo de Frontin, Mendes, Piraí e Rio Claro. (Fonte UFRRJ)